segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Vivendo em uma cela soteropolitana

Chega um momento que cansamos de viver com tanta hipocrisia. Chega o instante em que não suportamos mais fingir que está tudo bem, sem estar. Viver em Salvador está se tornando um martírio. Quem anda a pé se depara com a imprudência dos motoristas. São poucos os que respeitam a faixa de pedestre. Se você anda de ônibus, já sabe: eles sempre andam lotados, com velocidade acima do limite, um desconforto total. Se você anda de carro, não acha onde estacionar e perde todo o seu tempo em engarrafamentos. Se parar em um semáforo é logo abordado por alguém para lavar o para-brisa, pedir dinheiro, assaltar etc.
Em certas agências da Pituba, é tão frequente as chamadas "saidinhas bancárias" que os jornais só mostram quando o final é trágico.
Nós criamos um corredor próprio, analisamos cada trecho e rezamos para não acontecer nada no nosso dia-a-dia.
Nós não paramos para imaginar onde está a raiz dos problemas. Por que existem tantos assaltos a automóveis e a ônibus em nossa cidade?
O prefeito, o governador, todos despejam dinheiro na publicidade para mostrar o que fizeram, mas quem mais faz é o cidadão: ele fica trancado em sua casa, sem poder sair, é da casa para o trabalho e do trabalho para casa.
Como se não bastasse, o shopping, local onde a população urbana passou a frequentar, passou a não ser tão seguro, ocorrendo sequestros e outros crimes dentro destes estabelecimentos.
A criação do nosso percurso é mais ou menos parecido com o percurso das agências de viagens, dos cruzeiros marítimos, que evitam mostrar a parte feia de Salvador, para gerar uma boa imagem ao visitante. Mas nós não somos visitantes e quando fechamos os olhos para a enorme quantidade de mendigo, para a enorme quantidade de gente que vive em amontoados de casas sem estrutura, onde uma ambulância não chega, somos hipócritas e egoistas.
Sem dúvida, aqui tem muitas belezas, mas só podemos apreciá-las do alto dos edifícios ou em velocidade, ou sob forte medo. Nós estamos aceitando os problemas como sendo normais, quando deveria ser de outra forma. É possível mudar este quadro, mas inicialmente é preciso que mudemos a nós mesmos: primeiramente reconhecendo os problemas e manifestando nossa insatisfação, depois doando um pouco da gente, pelo menos uma palavra, com vistas a atacar os problemas detectados.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Idade mínima para entrar na Escola

A patente ilegalidade na limitação à idade mínima para ingresso na escola. Constituição Federal. Direitos Fundamentais.

A constituição Federal veio abarcar uma série de direitos fundamentais jamais vistos anteriormente. Estes direitos surgiram para fazer com que o cidadão consiga, por si só, utilizar-se dos recursos que a sociedade oferece para então alcançar seus objetivos, desistir, recomeçar, etc.
Não é à toa que o legislador constituinte previu no art. 23, V, ser competência comum da União, dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência.
Não se há de acreditar que a Lei Maior, ao distribuir uma competência tão relevante, no sentido de proporcionar o amplo desenvolvimento do indivíduo, venha tolhê-lo com limites injustificados.
É preciso se raciocinar, percebendo que o Estado tem o dever de proporcionar os meios para a educação. O próprio Estado vem se mostrar tão ineficiente, e chega ao ponto de interferir nos direitos fundamentais!
Não existe outra razão para o inciso V, do art. 23 existir senão para proporcionar a cada cidadão a possibilidade de se desenvolver, ajudar outras pessoas, a nação, inclusive fazer valer outros direitos fundamentais.

DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

O legislador achou por bem, através da via ordinária, modificar o ingresso dos alunos na escola, o fazendo por meio da lei n. 11214/06. É patente que esta lei vem vilipendiar o princípio da legalidade. Ora, na hipotética pirâmide kelseniana não se admite uma norma inferior derrogar uma norma superior.
Não consigo enxergar, senão como uma forma mascarada e indevida de o Estado intervir na vida do cidadão, a proibição de seus filhos se desenvolverem. É uma imposição no sentido de não aprender.
A derrogação fica mesmo no campo interpretativo, não se considerou que os pais, os quais convivem diariamente com seus filhos e a escola, são capazes de decidir o melhor momento para ingresso efetivo nos estudos. Cada caso é um caso.
A imposição legal, obrigando que a criança só inicie aos seis anos, me parece uma interferência, com tom ditatorial e de caráter muito vago. Há crianças que podem entrar com cinco anos e há crianças que só tem maturidade para iniciar o ensino fundamental aos 08 anos.

LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO

É importante que a educação no país tenha um rumo. Sem dúvida é necessário se saber para onde rema, senão o barco ficará à deriva. A educação nacional, embora tenha sua lei ( Lei 9394/96), anda mais que desorientada. Não tem diretriz eficaz, não tem base e conseqüentemente, não se tem educação de qualidade.
O texto da LDB, feito para profissionais do direito e não para professores, traz ambigüidades. Em alguns momentos não se sabe o que deve se aplicado na escola pública ou na escola particular.
O legislador brasileiro lançou mão da Lei 11.274/2006, para regrar a educação nacional, alterando a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), com o objetivo de formar apenas a partir dos seis anos.
No entanto ele não decifrou quando estes seis anos deveria ser completos: se até o final do ano letivo. Quando?
Não vejo porque não ser, já que se pretende melhorar a educação nacional, que não seja até o final do ano. Assim, a criança poderia ingressar no ensino fundamental desde que tivesse ou completasse seis anos, naquele ano, após análise do profissional capacitado.
Os critérios precisam ser objetivos. Não se pode deixar brechas para o chamado “jeitinho”.

LEI 11.274/2006

Este diploma legal, além de atacar a LDB, ataca ainda princípios que regem desde outrora a educação nacional. Houve uma forte interferência nas instituições educacionais e, de forma cega e ditatorial, estabeleceu prazo para que as escolas adiram que a lei estabelece.
Difícil será entender quais as razões que levaram os nobres parlamentares a adotarem tal postura. A criança, aos 06 anos, incompletos ou não, já tem muitas capacidades que precisam ser trabalhadas. Um ano perdido, ou não aproveitado da forma correta, fará falta no futuro.
Estar na escola, estudando para valer não é nenhuma pena, caso essa criança já possua capacidade de assimilar as competências correlatas. Não se causará nenhum trauma, desde que as atividades sejam equilibradas. Quem prestou a consultoria para afirmar que as crianças só tem capacidade de aprender após os seis anos, desconhece o potencial que elas possuem e incorreu em patente erro.

INAPLICABILIDADE EM FUNÇÃO DAS DIFERENÇAS REGIONAIS

É preciso ressaltar que, ao aprovar os diplomas citados, se implodiu parte do que existia de bom no sistema educacional. A vontade dos pais, da escola não foram levadas em consideração. A lei pretende reger do Rio Grande do Sul ao Amazonas. Ora, a própria Constituição reconhece a existência de diferenças regionais, colocando como objetivo a sua diminuição.
Se assim o é, por então aplicar um diploma que irá aumentar estas diferenças. Os costumes, a rotina de quem trabalha, o poder aquisitivo é totalmente diferente. É necessário um maior poder para os conselhos estaduais, municipais, debaterem as questões para a implementação das mudanças.


ASSISTÊNCIA EM CRECHES E PRÉ-ESCOLAS

Também o texto constitucional prevê que é direito de todo cidadão a assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até cinco anos de idade em creches e pré-escolas.
Não resta dúvidas que a Carta Magna prevê que a pré-escola, só vai até os cinco anos. Quando a criança já completou cinco anos já está, na maioria dos casos, apta a entrar no ensino fundamental, então, até o final do ano letivo ela completará os seis anos.
É mais um fundamento que se impõe colocar, para mostrar que a imposição do limite mínimo de seis anos para ingresso no ensino fundamental constitui um atraso para as crianças e acenam com resquício de abandono intelectual do Estado. O legislador que obrigar uma criança que faça aniversário em dezembro, completando 05 anos, que o mesmo só possa entrar na escola fundamental após mais de um ano. Esta imposição do legislador não resta dúvida que é abusiva. Ela vai de encontro aos direitos das crianças.
Não há que se questionar pois que a educação é direito de todos. É dever do Estado e é dever da família. Então a sociedade deve promover e incentivar, colaborando para o desenvolvimento da pessoa, com preparo para o exercício da cidadania.

VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LIBERDADE DE INICIATIVA

Também no que tange à educação, a constituição também prevê a liberdade de iniciativa, respeitadas as normas da educação nacional. Ocorre que há um choque entre uma norma infra-constitucional com uma norma contida na Constituição. O ensino é um direito. A educação pré-escolar não está atrelada ao ensino continuado, hoje chamado de fundamental (em nove anos) e médio.

A INTROJEÇÃO MODERNA DA IGNORÂNCIA NORMAL

Pedagogos saíram com a idéia de que o uso de caneta vermelha em provas gera traumas. Das mesmas mentes surgiram a afirmação da incapacidade intelectual da criança, forçando-a, mesmo sem querer de permanecer na série antiga, somente para cumprir a legislação.

CONCLUSÃO

A alteração contida na LDB, muito embora sancionada, ataca direitos fundamentais contidos na Constituição. É preciso se respeitar a liberdade da família para avaliar, juntamente com os profissionais da escola (professores, pedagogos) a capacidade da criança. É evidente que a responsabilidade direta é dos pais. São estes que irão acompanhar diariamente o desenvolvimento do seu filho. A imposição do Estado para que se limite, de forma inadequada a entrada da criança na escola, revela-se inadequada e imprópria. Um país que existe grande percentual de analfabetos deve prezar pelo ensino mais adequado e oportuno.
A sociedade, diretamente atingida por este problema poderá usar as vias judiciais, pleiteando junta às Varas da Infância e da Juventude, em uma ação própria, a autorização e ordem para as escolas matricularem seus filhos, desde que estes completem os seis anos durante o ano letivo. Entendo que assim, haverá uma ponderação de interesses, entre o que pretendia o legislador (voluntas legis), aplicando-se à práxis, de modo a atender aos anseios de pais, mestres e alunos e da escola como um todo.

Por,

Fabio Machado
Bacharel em Análise de Sistemas pea UNEB
Acadêmico de Direito na UFBA

sábado, 11 de julho de 2009

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Salvador - duas faces



É impressionante como existem três cidades, ou várias ciadades em uma só. Como assim?
Vou tentar explicar. Salvador, capital da Bahia, consegue abarcar duas cidades, duas realidades, normalmente dividida por uma avenida, formado uma terceira cidade maior e desigual. De um lado, a suntuosidade, do outro, a miséria. Existem bairros em Salvador que desconhecem o saneamento básico. As pessoas muitas vezes não possuem uma conta de energia para servir como comprovante de endereço, pois ainda não foram incluídas. Estão no escuro, ou arranjam o chamado "gato".
São duas realidades. O que chama a atenção é que todo bairro soteropolitano possui próximo, ou em sua volta um cinturão de pobreza. Será que as pessoas que prestam os serviços considerados mais simples, como de doméstica, gari, etc, saem dos prédios suntuosos ou dos cinturões pobres? Será que a mão de obra que construiu os prédios e resiências das elites é oriunda de onde? Ora, esses serviços são importantes.
A elite precisa da pobreza. É preciso que existam pobres para que a elite não tenha que pegar no pesado. Esta é uma lógica, que poucos tentam mudar, vai mostrar o desproporcional resultado dos acontecimentos ruins. Parece que a sorte não fica do lado pobre. É dificil se chegar a um bom emprego, passar no vestibular e, para os que passam, conseguir cursar faculdade.
Uma cidade que possui uma arquitetura histórica linda, uma orla belíssima, com praias agradáveis, deveria combater com mas veemência as desigualdades urbanas. Ao chegar a Salvador somos recepcionados com bairros, com amontoados de casas mal construídas, com poucas árvores, como se dissessem: esse crescimento foi desordenado.
O centro da cidade é um lugar onde existe um toque de recolher natural às 21h00. Os mendigos se amontoam na Praça da Piedade, alguns sobrevivem de pequenos furtos e alimentam sua dependência por drogas.
O interessante é que durante o carnaval os moradores de rua desaparecem. Para onde eles vão?
A cidade cresceu de forma desordenada. Existem problemas estruturais que precisam ser combatidos. Não há uma política eficiente para recuperação de usuários de drogas, nem conscientização da população para melhoria e preservação da cidade. Investe-se mais em repressão do que em prevenção. Vale o conceito: balas e fuzis custam menos que escolas. Faltam cursos, praças seguras para integração, projetos culturais que promovam a inclusão social. O resultado é sempre o mesmo: formação de gangues, agregando pessoas que já não sonham, que são escravos das drogas e que tentam proteger o seu nicho de vendas. É preciso relembrar que ninguém já nasce usando drogas, que ninguém pede para ocupar habitações indignas, que ninguém já nasce delinquente. Fugimos sempre desse diálogo e preferimos nos prender em nossas residências, não fazendo quase nada para mudar. Até a próxima.